As IFRSs (International Financial Reporting Standards) foram
implementadas em diversos países até 2010, e serão implementadas em mais
alguns países em 2011 e assim por diante. Esta é a previsão. As normas
internacionais de relatórios financeiros (IFRS na sigla em inglês)
encontraram obstáculos na sua implementação em alguns países – alguns
destes obstáculos maiores que outros. No Japão, por exemplo, a
implementação não foi simples – as normas japonesas eram bastante
restritivas e, visando a globalização da contabilidade e dos relatórios
financeiros, o Japão cedeu e mudou partes relevantes de suas antigas
normas.
Na Europa, muitas empresas tinham interpretações diversas das
antigas normas de seus respectivos países, e a adoção das IFRSs em seus
balanços consolidados ocorreu de forma menos “dolorosa”, embora não
menos “trabalhosa”. No Brasil, mudamos a legislação, a antiga “Lei das
S/A”, e iniciamos um processo contínuo de emissão e revisão de
pronunciamentos e interpretações técnicas, através do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis (CPC).
De acordo com pesquisa da KPMG, uma das empresas de auditoria e
consultoria que compõe o seleto grupo conhecido como Big-Four (as quatro
grandes empresas de auditoria e consultoria, somando-se a este grupo a
PwC, a Deloitte e a Ernst & Young), em mais de 100 países, empresas
listadas já estão preparando suas demonstrações financeiras utilizando
as IFRSs.
Quando o maior mercado de capitais do mundo – os Estados Unidos,
iniciou as discussões sobre uma possível adoção das IFRSs, reuniões
entre os Boards começaram a acontecer. Por um lado o FASB (Financial
Accounting Standards Board) – órgão responsável pela emissão das normas
técnicas nos Estados Unidos, e por outro o IASB (International
Accounting Standards Board) – órgão responsável pela emissão das normas
internacionais. Desde 2007 a SEC (Securities Exchange Commission –
equivalente americana da CVM brasileira) aceita que as empresas
estrangeiras listadas no mercado americano arquivem suas demonstrações
financeiras de acordo com os padrões internacionais, sem a necessidade
de reconciliação com o USGAAP. Destas reuniões, muito aprendizado,
algumas normas revisadas e melhoradas, mas especificamente em relação
aos Estados Unidos adotarem as normas internacionais, a evolução não foi
como se esperava.
Uma das maiores dificildades na implementação das IFRSs é a base em
conceitos. Diversos países, dentre eles o Brasil, estavam doutrinados e
acostumados a seguirem regras, ou seja, os profissionais de
contabilidade não tinham muito espaço para a criatividade (esta era a
teoria das regras rígidas, mas sabemos que a prática era outra). As
IFRSs trouxeram um conceito totalmente novo para diversos países, a
partir do qual os profissionais eram obrigados a interpretar as normas,
assim como a realidade das empresas e o contexto sócio-econômico dos
países nos quais estavam inseridos. E uma mudança deste porte não
acontece da noite para o dia.
Diversas tentativas continuam sendo feitas para harmonizar as normas
internacionais e, por enquanto, a intenção dos Estados Unidos ainda
parece ser a de adotar tais normas. Mas, como era de se esperar, não
será nada fácil harmonizarmos as normas internacionais sem ceder um
pouco ao maior mercado de capitais do mundo.
Em 16 de Novembro de 2011, a SEC emitiu um estudo sobre “Uma análise
das IFRSs na prática”. Tal estudo demonstrou que, como muitos previam,
diversos conceitos das IFRSs foram adaptados para a realidade de cada
país – isso significa que apesar das normas serem padronizadas, a
interpretação destas não foram.
“Dezoito medidas de lucro diferentes na demonstração de resultados,
dez tipos de lucro usados como ponto de partida para se apresentar o
fluxo de caixa operacional e seis lugares distintos para se informar o
lucro por equivalência patrimonial em coligadas e controladas.”
Isso demonstra que quando baseamos normas em princípios, e não em
regras, há espaço para a interpretação. Enquanto os USGAAP tentam
restringir a interpretação pessoal de cada profissional, as IFRSs deixam
brechas para que estas interpretações ocorram. E isto não quer dizer
que uma é melhor que outra, mas apenas que são diferentes. Já ouvimos
falar, algumas vezes, que as regras foram feitas para “limitar o poder
de criatividade de alguns contadores”. E isso é exatamente o que ocorre
com os USGAAP (United States Generally Accepted Accounting Principles),
mas que ainda não é bem assim com as IFRSs.
“De forma geral, a SEC entende que as empresas cumprem os
requerimentos do padrão internacional. Mas chama atenção não apenas para
as diferenças, geradas pelas opções permitidas pelas IFRSs e pela falta
de regras detalhadas desse modelo, mas também para a falta de
transparência sobre práticas e premissas contábeis e para o
descumprimento de regras em si.”
O documento emitido pela SEC, sobre este estudo, contém 65 páginas e
pode ser encontrado no site da mesma. Este estudo demonstra, basicamente
e ao nosso ponto de vista a partir do Brasil, dois aspectos positivos:
(i) a SEC está realmente preocupada em estudar e conhecer as normas
internacionais antes de tomar qualquer decisão que pode mudar a cara das
empresas americanas e (ii) que o planejamento americano, mais uma vez,
tem muito a nos ensinar.
Sem dúvida, IASB e FASB em conjunto ainda terão diversas reuniões
antes de qualquer decisão por parte dos Estados Unidos. Isso tem um
ponto positivo, que é a constante revisão das normas internacionais e
aprimoramento das mesmas, assim como das americanas. O benefício é
global, independente da adoção ou não das IFRSs pelos americanos. Porém,
se os Estados Unidos estão esperando algo a “limitar a criatividade dos
contadores”, podemos esperar fortes impactos – limitar a criatividade
de empresas e contadores significa emitir regras específicas e
detalhadas para cada assunto, e não basear-se em princípios.
Inserir normas internacionais baseadas em princípios nos Estados
Unidos requer um jogo de paciência e uma mudança cultural nos
profissionais americanos jamais vista antes. E isso requer tempo.
Americanos estão acostumados a “fechar o cerco” para limitar ações de
profissionais, principalmente no mercado financeiro. Qualquer escândalo
ou crise geram regras específicas, regulações minuciosas, assim como a
Sarbanes Oxley, Dodd Frank Act, dentre outros. E mudar esta cultura não
será nada fácil. Uma das intenções é adotar as IFRSs nos Estados Unidos
até 2015, e esta data ainda está em discussão.
No Brasil podemos esperar, no mínimo, melhorias das normas
internacionais e, consequentemente, dos CPCs. O máximo que podemos
esperar são regras específicas emitidas pelo IASB, o que mudaria tudo
novamente.
Por Lucio Ferreira Barbosa
Fonte: http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/o-maior-desafio-das-ifrs-o-usgaap/60280/
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