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quinta-feira, 12 de maio de 2011

Frankenstein tributário

 

Por Marcos Cintra*
Tudo leva a crer que a tão esperada reforma tributária, mais uma vez, não vai acontecer. Conforme vem sinalizando o governo, o que pode ocorrer são remendos tributários que não atendem necessidades fundamentais como a simplificação do sistema, o combate à evasão de arrecadação, a redução dos custos administrativos para as empresas e a redistribuição do ônus tributário entre os contribuintes. O Brasil continuará tendo a pior estrutura de impostos do mundo, conforme apurou o Fórum Econômico Mundial.
A reforma tributária vem sendo discutida desde os anos 90 e de lá para cá nenhum governo foi capaz de fazê-la. Nos últimos vinte anos a regra foi levá-la em banho-maria enquanto os burocratas promoviam mudanças pontuais em um ou outro imposto com o objetivo de aumentar a arrecadação. Essas medidas isoladas, como alterações na base de cálculo ou na forma de cobrança de tributos, criaram a atual estrutura tributária caracterizada pela complexidade, alto custo e forte desigualdade na distribuição do ônus entre os contribuintes.
Uma referência sobre o fracasso de um processo fatiado de ações tributárias deve ser o que ocorreu logo no primeiro ano de governo do presidente Lula, que fez um estardalhaço para anunciar que a reforma havia sido realizada. Se vangloriou dizendo que fez em um ano de governo o que a gestão anterior não foi capaz de realizar em oito anos. Nada mais falso!
A pseudo-reforma tributária empreendida por Lula se limitou a uma enxurrada de ações pontuais como a prorrogação da CPMF e da DRU (Desvinculação de Receitas da União), ampliação da fração da Cide destinada aos Estados e a criação do Fundo de Compensação de Exportações. Além disso, avançou sobre os prestadores de serviços através da criação do PIS/Cofins não-cumulativo, o aumento da base de cálculo da CSLL e o novo ISS.
Depois dessa movimentação toda, chamada de reforma tributária por alguns, o que se observou foi que a sonegação continua sendo a regra, a estrutura não foi simplificada, a burocracia ainda impera e a incidência tributária continua péssima. O fatiamento no governo anterior fez o “Frankenstein tributário” ficar ainda mais horripilante e seguir devorando a classe média e a competitividade da economia.
O atual governo erra ao ignorar o passado e propor uma reforma tributária fatiada. Não se discute aqui os méritos de ações como o reajuste do limite de faturamento para enquadramento de empresas no Simples, a desoneração da produção, a redução do INSS sobre a folha de pagamentos e as alterações no ICMS. O que está em jogo é a oportunidade que o País vai perder para empreender uma mudança ampla nos moldes que a sociedade deseja.
Esse fatiamento não pode ser chamado de reforma tributária. É uma continuação de erros dos últimos anos que fará com que o País perca mais uma chance de racionalizar seu sistema de impostos. As anomalias da estrutura atual não serão eliminadas com mais do mesmo remédio de sempre. O que está sendo proposto será apenas mais uma maquiagem. A essência continuará a mesma e logo o tema voltará. É uma pena, mas o “Frankenstein” terá mais uma sobrevida.
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* Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.
Fonte: www.marcoscintra.org / mcintra@marcoscintra.org via http://www.joseadriano.com.br/

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