Por Fernando Torres | De São Paulo
É remoto, possível ou provável? A decisão de colocar uma etiqueta em
cada pendência fiscal, trabalhista ou cível - decisão que precisa ser
tomada pelas empresas a cada novo balanço - não é simples como pode
parecer. Essas três palavras têm poder.
Com uma simples opinião, a administração de uma empresa pode aumentar
ou diminuir o resultado de um exercício. E é exatamente por isso que os
acionistas precisam ficar de olho na resposta dos administradores.
"A conta de provisões dos balanços é cheia de subjetividades e a
legislação complexa gera possibilidade altíssima de gerenciamento de
resultados", afirma Antônio de Cístolo Ribeiro, pesquisador da Faculdade
de Economia, Administração e Contabilidade da USP de Ribeirão Preto, em
sua dissertação de mestrado.
Gerenciamento de resultado é a prática de usar brechas previstas nas
regras contábeis para elevar ou reduzir o lucro de um determinado
exercício, com o objetivo de satisfazer interesses de curto prazo da
empresa ou da própria administração.
Foi justamente disso que uma acionista minoritária acusou a TIM, ao
alegar que a empresa não estaria fazendo adequadamente suas provisões
para contingências tributárias - o que a companhia nega categoricamente.
A acionista, JVCO Participações, do empresário Nelson Tanure, diz que
levou o caso à Comissão de Valores Mobiliários e para a Securities and
Exchange Commission (SEC), uma vez que a TIM tem recibos de ações
negociados na Bolsa de Nova York.
Um dos conselheiros fiscais, Jorge Lepeltier também chamou atenção para
o tema de contingências no balanço de 2011 da TIM, depois de notar que o
total de disputas classificadas como de perda possível, para as quais
não existe provisão, teria subido de R$ 3,1 bilhões para R$ 6,6 bilhões
no intervalo de 12 meses.
A PwC, responsável pela auditoria externa da TIM, emitiu parecer sem ressalvas.
De fora, é impossível chegar a uma conclusão sobre o caso específico da
TIM, embora a empresa de telefonia apresente de forma detalhada em seu
balanço, em quase 15 páginas (o que é bem acima da média), uma lista dos
principais processos em que é ré.
A decisão sobre constituir ou não provisão talvez seja uma das mais
sensíveis dos balanços, envolvendo não apenas as incertezas ligadas ao
Judiciário como também julgamentos do comando da empresa, de assessores
jurídicos contratados para emitir laudos sobre os processos e dos
auditores.
De acordo com o estudo do pesquisador da FEA-RP, que teve orientação da
professora Dra. Maísa de Souza Ribeiro, a relação entre a conta de
provisões e a de receita de um grupo de 343 companhias abertas no
período de 2006 a 2010 variou entre 11,8% e 14,7%, sem nenhuma grande
tendência de alta ou baixa. Na comparação com o total de ativos, a
relação girou em torno de 5% a 6% nesse período.
Apesar da estabilidade dos percentuais, os índices mostram a relevância
do assunto, que muitas vezes é negligenciado por investidores de curto
prazo, mas que é observado com lupa em processos de fusões e aquisições.
A norma contábil que regula a constituição ou não de reservas para
pagamento de perdas em processos judiciais já permite um certo grau de
subjetividade, a que estão sujeitas todas as empresas que seguem o
padrão contábil IFRS, usado em mais de cem países.
Conforme o CPC 25, diante de um processo judicial, a empresa deve
avaliar se a chance de perda na disputa é provável, possível ou remota.
Apenas no primeiro caso a empresa deve constituir provisão no balanço
para cobrir as eventuais perdas que tiver. Se a perda for "possível" é
preciso apenas divulgar a informação nas notas explicativas. No caso de a
chance de derrota ser considerada remota pela empresa, nem sua
divulgação é necessária.
Para deixar mais claro o que quer dizer com "provável", o texto da
norma diz que essa deve ser a classificação usada quando o risco de
perder a disputa for maior do que a chance de ganhar - ou seja, qualquer
probabilidade de perda acima de 50%.
É uma linha muito difícil de se traçar, mesmo com a ajuda de um matemático especialista em probabilidade.
Mas segundo o pesquisador Antônio de Cístolo Ribeiro, no caso
brasileiro, e em especial na área tributária, a situação se torna mais
preocupante. "Uma pendência que passe pela esfera administrativa e
judicial pode demorar 16 anos ou até mais para ter uma decisão final.
Como o prazo é muito longo e a jurisprudência muda muito, abre-se uma
área especial para gerenciamento de resultados", afirma Ribeiro.
Ao checar o balanço de uma empresa, os auditores dedicam especial
atenção para as contingências. Mas quem elabora o balanço é a própria
companhia.
Sem uma solução negociada, existe a possibilidade de o auditor colocar
uma ressalva no parecer. Mas essa tampouco é uma decisão fácil. "Para o
auditor fica difícil, primeiro porque ele está falando com o cliente que
o contrata. Além disso, uma decisão subjetiva sempre pode ser
discutida", afirma.
Em seu estudo, o pesquisador relata alguns tipos de gerenciamento de resultados envolvendo disputas tributárias.
Após receber um auto de infração em um ano de resultados operacionais
ruins, mesmo sabendo que deve perder a causa, a empresa pode entrar com
recurso e obter um laudo de um advogado que diga que a chance de perda
na disputa é apenas possível, e não é provável. Assim, a empresa pode
postergar a realização da provisão para um ano em que tiver uma folga no
balanço.
Em outro caso, a empresa pode entrar com o recurso com a expectativa de
que o governo crie um programa para pagamento de tributos em atraso, do
tipo Refis, que ocorre com certa regularidade no país. "Aí ela tem a
opção de pagar a dívida com desconto, de forma parcelada ou até mesmo de
ser perdoada", diz.
Uma terceira forma de gerenciar os resultados é fazer o contrário. Ser
mais conservador e constituir provisões além do que seria o necessário
em determinado momento para poder revertê-las e melhorar o resultado de
um ano menos favorável no futuro.
Tempo dará visibilidade à prática
Apesar do cenário que traça em sua dissertação de mestrado, Antônio de
Cístolo Ribeiro, pesquisador da FEA de Ribeirão Preto, considera que há
esperança de que diminua o espaço para gerenciamento de resultados com
base nas contingências tributárias.
De acordo com ele, desde a adoção do IFRS, aumentou a divulgação sobre
esse tema nos balanços, com um crescimento perceptível do número de
citações das palavras "provisão" e "contingência" nos demonstrativos de
grandes empresas analisadas.
Além disso, aumentou a transparência na nota explicativa que trata
desse tema, com a quebra da divulgação em saldo inicial, adições,
reversões, pagamentos e saldo final. "Com um prazo maior, isso já
permite que o usuário verifique se a empresa começa a provisionar muito e
depois faz reversão, por exemplo."
Ainda segundo ele, existe o fator tempo, para que as empresas e os
usuários das informações se acostumem com as regras. "Aos poucos, o
próprio mercado vai definir práticas para certos tipos de operações. Se
houver um desvio, vai ser mais fácil de ser detectado", afirma o
pesquisador.
Ele recomenda ainda que haja uma padronização nos laudos feitos pelos
advogados para definir a chance de perda em determinada disputa
judicial, para se reduzir o espaço para "manobras". (FT)
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Fonte: Valor Econômico via http://www.4mail.com.br/Artigo/Display/017472000000000 |
Objetivo: Disseminar conteúdos relevantes sobre Contabilidade, Tributos, Sped, IFRS entre outros.
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
Ambiente jurídico do país facilita gerenciamento de resultados
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